terça-feira, 5 de maio de 2009

Memórias de infância: O pregão

À saída da missa dominical lá estava o pregoeiro no seu lugar para principiar o pregão.
O pregoeiro da freguesia subia o muro da 'Avenida' e dirigia-se ao Povo, ora posicionado no adro da igreja ora a um canto da 'Avenida'.
Não se tratava de um pregoeiro, qual personagem de um qualquer romance bairrista ou bucólico. O Sr. Ângelo, porventura o último a dizer pregões na Ribeira da Janela, era bem real.
Aliás, o Sr. Ângelo foi também o coveiro durante largos anos.
Da sua boca saíram pregões sobre a abertura de uma espécie de 'concurso público' para levadeiro ou da abertura da época da vindima.
Sabia-se por ele o preço a que as casas de Vinhos iriam comprar o quilo da uva verdelho ou sercial, os subsídios a que os agricultores se poderiam candidatar, as sessões de formação a que poderiam assistir.
Era ele que dava voz aos editais camarários que ninguém lia porque a maioria da população e era analfabeta. Os editais teriam de ser verbalizados.
Eram anunciados por meio de pregões. Era ele que anunciava as horas de funcionamento da delegação local do 'grémio' para comprar 'guano' ou 'sulfato' para a vinha.
O Sr. Ângelo era também cantoneiro de limpeza de caminhos e veredas. Ninguém como ele, munido de uma espécie de sacho, arrancava erva das reentrâncias da calçada.
Ainda estou a vê-lo de joelho direito no chão, a arrancar as ervas daninhas dos caminhos municipais. O caminho ficava um mimo.
O último pregoeiro público da Ribeira da Janela já partiu.

Sem comentários: